Rescisão Indireta

Jerônimo Pereira • 3 de junho de 2025

Quando a "Justa Causa" é da Empresa

No universo das relações de trabalho, a ideia de "justa causa" quase sempre remete à falha do empregado. No entanto, o que muitos trabalhadores não sabem é que a justa causa também pode ser do empregador, gerando o direito à chamada Rescisão Indireta.

Trata-se de um mecanismo legal pelo qual o trabalhador pode "demitir" o empregador, encerrando o contrato de trabalho e, ainda assim, receber todas as verbas rescisórias como se tivesse sido demitido sem justa causa. Em outras palavras, quando a empresa comete uma falta grave que inviabiliza a continuidade da relação de emprego, o trabalhador pode buscar a rescisão indireta.


O Que é a Rescisão Indireta?

A Rescisão Indireta é a dissolução do contrato de trabalho por iniciativa do empregado, em razão de uma falta grave cometida pelo empregador. É como se a "justa causa" fosse invertida, dando ao trabalhador o direito de sair do emprego, mas com o benefício de receber todos os seus direitos como se tivesse sido demitido sem justa causa (aviso prévio, FGTS + multa de 40%, seguro-desemprego, férias proporcionais + 1/3, 13º salário proporcional, etc.).


Quando a Falta da Empresa Configura Rescisão Indireta?

A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em seu artigo 483, elenca as hipóteses que podem configurar a justa causa do empregador. As situações mais comuns e que mais geram processos de rescisão indireta incluem:

  1. Atraso Habitual de Salário ou Não Pagamento:
  • Um dos motivos mais frequentes. O atraso reiterado (não apenas um atraso pontual) no pagamento de salários, férias, 13º salário ou outras verbas rescisórias já configura falta grave.

Exemplo: A empresa atrasa constantemente os pagamentos de salário, ou não paga o 13º salário ou as férias no prazo legal.


Exigir Serviços Superiores às Forças do Empregado, Defesos por Lei, Contrários aos Bons Costumes, ou Alheios ao Contrato:

  • O empregador não pode exigir do trabalhador tarefas que o coloquem em risco excessivo, sejam ilegais ou imorais, ou que não correspondam à sua função contratada.

Exemplo: Um auxiliar administrativo que é constantemente obrigado a realizar tarefas de carga e descarga de materiais pesados, ou ser forçado a cometer atos ilícitos.


Tratar o Empregado com Rigor Excessivo ou Submetê-lo a Assédio Moral/Sexual:

  • Comportamentos abusivos, humilhações constantes, exposição a situações vexatórias, gritos, ofensas, piadas de cunho sexual ou intimidação. O ambiente de trabalho deve ser respeitoso.

Exemplo: O chefe que persegue um funcionário com cobranças impossíveis, ou faz comentários depreciativos e de cunho sexual.


Não Cumprir as Obrigações do Contrato de Trabalho ou da Lei:

  • Abrange uma vasta gama de descumprimentos. A empresa não depositar o FGTS corretamente, não recolher o INSS, não fornecer equipamentos de proteção individual (EPIs) quando obrigatório, não conceder o descanso remunerado, ou qualquer outra violação contratual ou legal.

Exemplo: O empregador que não registra o funcionário, ou registra com salário menor que o real, ou não faz os depósitos do FGTS regularmente.


Correr Perigo Manifesto de Mal Considerável:

  • Quando o empregado é exposto a riscos graves à sua saúde ou segurança no ambiente de trabalho sem a devida proteção.

Exemplo: Trabalhar em local insalubre ou perigoso sem o fornecimento de EPIs, ou com máquinas sem a devida manutenção.


Redução do Trabalho do Empregado, de Forma a Afetar o Valor da Remuneração:

  • Isso ocorre quando o empregador reduz a quantidade de serviço ou a remuneração do empregado por peça ou tarefa, de forma que o salário do trabalhador seja prejudicado, sem justificativa legal.


Como o Trabalhador Deve Agir?

Se você se encontra em uma dessas situações e sente que a continuidade do vínculo de emprego é insustentável, é crucial agir corretamente:

  1. Documente Tudo: Reúna provas concretas das faltas do empregador (extratos bancários com atrasos salariais, prints de mensagens de assédio, e-mails, fotos, testemunhas, etc.).
  2. Procure um Advogado Especialista em Direito do Trabalho: Esta é a etapa mais importante. O profissional irá analisar seu caso, avaliar a gravidade das faltas da empresa e a viabilidade da rescisão indireta. Ele o orientará sobre a melhor forma de proceder.
  3. Mantenha o Contrato de Trabalho: Na maioria dos casos, o trabalhador deve continuar comparecendo ao trabalho enquanto aguarda a decisão judicial, para não dar margem para a empresa alegar abandono de emprego. A exceção é se a permanência no ambiente for insustentável ou perigosa (ex: assédio severo, risco de vida), o que deve ser orientado pelo advogado.
  4. Ingresso na Justiça do Trabalho: O advogado dará entrada em uma Ação de Rescisão Indireta na Justiça do Trabalho, onde serão apresentadas as provas e o juiz decidirá se houve justa causa do empregador.


A rescisão indireta é um direito fundamental que protege o trabalhador de abusos e garante que ele não seja penalizado por faltas graves cometidas pela empresa. Não aceite condições de trabalho abusivas. Se seus direitos estão sendo desrespeitados, não hesite em buscar a justiça.



Por Jerônimo Pereira 3 de junho de 2025
Seus Direitos Ampliados por Recentes Julgados do STF
Por Jerônimo Pereira 3 de junho de 2025
No coração do Amazonas, a realidade de milhares de trabalhadores terceirizados, especialmente nas áreas da vigilância e da saúde, tem sido marcada por uma preocupante instabilidade: os atrasos e a falta de pagamento de salários . Essa situação, que beira o descaso, afeta diretamente a subsistência de famílias e a dignidade de quem dedica seu tempo e esforço a serviços essenciais para o Estado . É fundamental que esses profissionais, muitas vezes na linha de frente, saibam que, apesar dos desafios impostos por empresas irresponsáveis e pela burocracia, seus direitos são garantidos e existem caminhos para reavê-los. A Terceirização e o Cenário Amazônense A terceirização , amplamente utilizada pelo Poder Público e pela iniciativa privada, permite que empresas contratem outra para prestar serviços específicos . No Amazonas, é comum vermos vigilantes protegendo patrimônios públicos e profissionais da saúde atuando em hospitais e unidades básicas, todos vinculados a empresas terceirizadas que, em tese, deveriam ser responsáveis por seus salários e benefícios. No entanto, a prática tem mostrado uma falha alarmante nesse sistema. Empresas que não cumprem suas obrigações básicas geram um verdadeiro caos financeiro para o trabalhador, que se vê sem recursos para o aluguel, alimentação e outras despesas essenciais. A Responsabilidade do Estado e o Novo Entendimento do STF (Tema 1.118) Tradicionalmente, quando uma empresa terceirizada falhava no pagamento de direitos trabalhistas, o ente público contratante (seja o Governo do Estado, Prefeituras ou outros órgãos) poderia ser responsabilizado subsidiariamente. Ou seja, se a empresa principal não pagasse, o Estado, por ter se beneficiado do trabalho, arcaria com a dívida. Contudo, uma recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do Tema 1.118 de Repercussão Geral , trouxe uma mudança importante. O STF estabeleceu que a responsabilidade subsidiária do ente público não é automática . Para que o Estado seja condenado a pagar as dívidas trabalhistas da terceirizada, o trabalhador precisará provar que houve falha ou negligência do poder público na fiscalização do contrato . O que isso significa para você, trabalhador no Amazonas? Significa que não basta a empresa terceirizada não pagar. É preciso demonstrar à Justiça que o órgão público contratante (por exemplo, a Secretaria de Saúde ou de Segurança) não fiscalizou adequadamente se a empresa estava cumprindo suas obrigações trabalhistas, permitindo que a situação dos atrasos ocorresse. Isso pode ser comprovado por meio de: Denúncias anteriores: Se você ou colegas já denunciaram a falta de pagamentos ao órgão público e nada foi feito. Falta de documentos: Se a empresa não apresentava regularmente ao órgão público comprovantes de pagamentos de salários, FGTS, INSS. Irregularidades evidentes: Outras situações que demonstrem que o Estado "fechou os olhos" para o descumprimento das leis trabalhistas pela empresa terceirizada. Como o Trabalhador Deve Agir para Buscar Seus Direitos? Diante dos atrasos salariais e da necessidade de comprovar a falha do Estado, a ação do trabalhador terceirizado torna-se ainda mais crucial. Não se desespere! Existem caminhos para garantir que seus direitos sejam cumpridos: Documente Tudo: Guarde todos os contracheques, registros de ponto, extratos de FGTS, e-mails, mensagens de WhatsApp ou qualquer comunicação sobre os atrasos. Se houver denúncias formais feitas à empresa ou ao órgão público, guarde os protocolos. Busque o Sindicato da Sua Categoria: Sindicatos como o dos Vigilantes ou dos Trabalhadores da Saúde no Amazonas podem já estar cientes da situação e oferecem suporte e orientação jurídica aos filiados. Eles podem ter informações sobre ações coletivas ou acordos em andamento. Procure um Advogado Especialista em Direito do Trabalho: Esta é a medida mais assertiva. Um profissional experiente na área trabalhista será fundamental para: Analisar sua situação específica e os documentos. Orientar sobre a melhor estratégia, considerando o novo entendimento do STF. Reunir as provas necessárias para demonstrar a negligência do Estado. Ingressar com uma Reclamação Trabalhista na Justiça do Trabalho. Negociar com a empresa terceirizada e o ente público. 4. Não Espere! Muitos direitos trabalhistas têm prazos para serem reclamados (prescrição). Quanto antes você buscar seus direitos, maiores as chances de sucesso. Não permita que a negligência alheia comprometa seu sustento e sua dignidade . Se você é trabalhador terceirizado, em especial vigilante ou profissional da saúde no Amazonas, e está sofrendo com atrasos salariais ou outras violações de direitos, Busque um advogado de confiança para oferecer a orientação e o suporte jurídico de que você precisa para reaver o que é seu por direito.